O discurso: epopéia de minha vida

sexta-feira, março 04, 2005

Atentado ao idioma


( carta redigida por mim, em relação à matéria divulgada pelo jornal Vale Paraibano, 04/03/05)

Fiquei muito chocado quando li a matéria intitulada Atentado ao Idioma, redigido pelo Sr. Luiz Gonzaga Bertelli, presidente do CIEE que se referiu entre outras ao deputado federal e ministro, Aldo Rebelo, que tramitou no Congresso Nacional um projeto de sua autoria, proibindo o emprego de estrangeirismo e em especial os de origem inglesa.
Sabemos bem que o inglês é hoje a língua veicular, de transações globais, por onde se pode ter um contato ideológico-cultural entre as nações. Muitos dos termos referidos como estrangeirismos, são necessários para a evolução de nossa sociedade junto às comunidades globais. É um absurdo afirmar que o português possa se extinguir; é mais apropriado afirmar que o inglês pode sofrer uma mutação muito grande devido ao número de falantes, podendo ser base para a criação de novos idiomas, assim como aconteceu com o Latim. Segundo Ferdinand de Saussure (pai da lingüística moderna, 1987-1913) a língua “é uma instituição social” ¹, “a língua é elaborada pela comunidade, é somente nela que ela é social (...) e o único elemento variável ao qual se pode recorrer para dar conta da variação lingüística é a mudança social” ².Logo, o sinal de estrangeirismo é sinal de que nossa sociedade tem evoluído.
É também pouco sensato se preocupar com a formação sintática das frases em nosso idioma, já que a gramática normativa não tem variantes, ou seja, a elaboração de uma frase com o estrangeirismo não perde sua estrutura gramatical (salvo para o gerundismo, que assola principalmente pessoas com um certo domínio da língua, ex. “vou estar ligando para confirmação”, esta é uma característica forte entre pessoas de poder aquisitivo e ou pessoas que tentam falar de maneira formal) entretanto, é exclusivamente verbalizado. Devemos voltar nossos olhares a falta de recursos sócio-culturais em nossa cidade, onde se encontra verdadeiramente a degradação, em outras palavras, não se tem incentivo real na construção da identidade social. Não há escolas de nível regular em nossa cidade e a única biblioteca pública (Cassiano Ricardo) não pode dar conta de toda a comunidade com sua estrutura e seu conteúdo (muitas vezes) desatualizado.
Penso que o empecilho de uma lei que proíbe o uso de estrangeirismo (seja ele de forma comercial ou social) possa não somente atrasar nossa sociedade em termos de compreensão do mundo atual, como também é um atentado a nossa liberdade de expressão. A lei me faz refletir sobre a estrutura educacional em que se baseiam certas pessoas, seria loucura pensar em reflexo de um atraso intelectual de nossa nação? Melhor mesmo seria investir tempo em estudos sobre a educação brasileira, para que alunos de 3° ano do ensino médio possam concluir a escola com o mínimo de capacidade crítica, sócio – ideológico – cultural.


Rafael Carvalho, 22 anos, estudante do 3° ano da faculdade de letras
UNIVAP - Universidade do Vale do Paraíba.

1. 1. Ferdinand de Saussure, Cours de linguisitque générale, Paris, Payot, 1931, p. 33.
2. Louis-Jean Calvet, Sociolingüística: uma introdução crítica, tradução Marcos Marcionilo, parábola,2002.
Rafael, 4:27 PM

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